segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009


Fui buscar uma correspondência pictórica pro texto garimpado do Murilo Mendes / encomendado pela Irene / e escolhi, sempre, o óbvio: Ismael Nery, o pintor-amigo, o filósofo-profeta. Apesar do paradoxo. Era assim que Murilo o lia. (Não localizei as referências desta tela.)



A baleia Murilo Mendes


A baleia é um cetáceo da família dos Balenídeos de forma quadradoredonda, cor de burro quando foge. Quem descobriu os abismos da baleia, animal bárbaro, barbado?

A baleia: auto-suficiente, melvilleana, inexpugnável.

A baleia caminhou três dias e três noites no oco de Jonas, restituindo assim a visita que o profeta fizera anteriormente ao seu próprio oco. A baleia aprofundou-se: viu, ouviu, cheirou histórias de arrepiar, coisas espantosas deste e do outro mundo, que os profetas sabidos conhecem, ruminam, difundem entre os homens e os bichos. Coisas, histórias rodando, evoluindo através dos tempos, elucidativas, oportunas em qualquer circunstância da vida individual ou universal.
Desde então a baleia, movida a óleo de autopropulsão, se auto-informa, se auto-espanta e não se comunica com pessoa alguma ou bicho. Construiu seu automuro. Reina soberana, sem vizinho ou confronto, sobre os mares e os mores, excluindo-se voluntariamente da carta das rações.
In illo tempore, quando tomei conhecimento da história de Jonas, sonhava em construir um moderno arpão para aferrar a baleia. Consultei a propósito um amigo de casa, o engenheiro Povoa. Ele, conversando com meu pai, disse que eu estava nos arredores de perder o juízo: “É alarmante essa preocupação contínua do seu filho com arpão e baleia”.
Ingênuo engenheiro Povoa: ignorava que tudo é alarmante; que todas as coisas são alarmantes; por sinal que a baleia não é das mais.

A aorta da baleia é maior no calibre do que o tubo maior do sistema de encanamentos de Londres, e a água que ruge na passagem de tal tubo é inferior em ímpeto e velocidade ao sangue que jorra do coração da baleia.
(Poley, citado por Melville).


Poliedro (Roma 1965/66), 1972

2 comentários:

  1. Lugui-Lucio! Seus textos sao muito cabeça pra mim, mas continuarei vindo aqui, agora que descobri! Nao posso comentar de verdade agora, to no trabalho, mas depois de ler com convicção... Ah! vai no meu? Mas vc tem que me dar seu email certinho, pra eu poder te permitir lá. Por enquanto pode visitar o devaneioscontidos.blogspot.com, porque esse é meio puto, é pra todos! hehe Beijo!

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  2. Isso tudo é muito misticamente bonito, =]






    professor.

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